quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Ducha fria

A manifestação dos comandantes militares, afirmando que o Brasil é uma democracia e, portanto, sem possibilidade de golpe, caiu como uma ducha de água fria no entusiasmo de colunistas como Arnaldo Jabor, Merval Melo e Rodrigo Constantino, além de alguns políticos da oposição, que vinham pregando a derrubada da presidenta Dilma Roussef. “Os militares estão totalmente inseridos na democracia e não vão voltar. Isso eu garanto”, disse o almirante Julio Soares de Moura Neto, comandante da Marinha, à jornalista Mônica Bérgamo, da “Folha de São Paulo”. Sua posição foi endossada pelo comandante do Exército, general Enzo Peri, e pelo comandante da Aeronáutica, brigadeiro Junito Saito. Com essa manifestação os golpistas ficaram frustrados e os ânimos, ampliados antes pela grande mídia – o “Estadão” chegou, em editorial, a pedir o impeachment da Presidenta – arrefeceram, inclusive no Congresso Nacional, onde alguns oposicionistas, liderados pelo candidato derrotado Aécio Neves, já consideravam como favas contadas a saída de Dilma do Palácio do Planalto. De repente, como num passe de mágica, vozes antes inflamadas silenciaram. Também contribuiu para essa calmaria os novos depoimentos da deleção premiada do Lava-Jato, que começaram a incluir entre os beneficiários das propinas políticos com mandato também do PSDB. E alguns parlamentares que apontavam o dedo sujo para os outros os recolheram de imediato. Os vazamentos do inquérito, dito sigiloso, viraram mesmo rotina e os veículos de comunicação divulgam documentos, gravações e imagens, como se esse procedimento fosse normal, selecionando os trechos que atendem a seus interesses políticos e econômicos. E ninguém faz nada, encarando esses vazamentos como naturais. Até quando?

Complexo

Todas as vezes que perde no voto, a oposição no Congresso Nacional recorre ao Supremo Tribunal Federal, como se este fosse o poder maior do país. Primeiro foi o PSDB, através do deputado Carlos Sampaio, que entrou com ação no STF contra a aprovação, pela Comissão Mista do Orçamento, do projeto do governo que altera a LDO para aumentar o abatimento da meta de superávit para este ano. Agora foi a vez dos demais partidos que formam a oposição. A iniciativa dos oposicionistas confirma a suspeita de que os próprios parlamentares se sentem inferiorizados diante do Judiciário, embora a Constituição Federal estabeleça que os poderes “são independentes e harmônicos entre si”. Certamente por isso, volta e meia um único ministro do Supremo, com apenas uma canetada, derruba decisões do Congresso Nacional. Diante disso, talvez fosse mais prático – e mais econômico para os cofres da nação – que se extinguisse o Legislativo e se deixasse ao Judiciário a tarefa de legislar. Se evitaria todo esse barulho dos parlamentares em torno de qualquer coisa que contraríe os seus interesses, porque, na verdade, eles estão mais preocupados consigo mesmos do que com os interesses da nação.

domingo, 23 de novembro de 2014

Último quintal

O confrade Francisco Sidou mandou-me, com pedido de publicação, a seguinte crônica: "Li, certa feita, em alguma biblioteca pública, quando estudante, um livrinho delicioso intitulado "A cultura dos quintais". Já procurei na internet e não consegui localizar nem o título do livro, nem seu autor. O Alfredo Garcia, poeta e escritor paraense (dos bons), tem uma obra nesse gênero, salvo engano. Talvez ele possa ajudar os leitores do Espaço Aberto dando uma "canja", pois não ? Pois bem. A leitura daquele livrinho me foi de grande valia na juventude. Aprendi, por exemplo, que as crianças que brincam (brincavam...) no quintal são mais alegres e saudáveis. O contato com a natureza lhes faz tão bem que elas se tornam adultos mais cordiais, inteligentes e sensíveis. Tive essa valiosa experiência na infância. Nossa casa no interior (Eirunepé-AM) tinha um quintal que era um verdadeiro pomar e ainda dava para o belo Rio Juruá , onde havia um porto de pequeno porte com um trampolim, no estilo "toboagua" de hoje, onde a garotada se divertia a valer, pulando e saltando naquela imensa piscina natural. Era uma festa no interior. Meu pai (Luiz Sidou) era um ecologista nato, numa época em que ainda não se falava em ecologia. Não tinha instrução acadêmica, mas possuía grande sensibilidade e respeito no trato com a natureza, pois havia tirado o sustento da família trabalhando, como seringueiro, nas brenhas do Rio Tarauacá, durante os verdes anos de sua juventude. Ele costumava dizer que o homem insensato é aquele que destrói a fonte de seu próprio sustento. Alguém tem alguma dúvida disso nos "tempos modernos", em que o desmatamento feroz ameaça transformar a Amazônia em imenso deserto? Essas recordações me veem à mente depois de ler na coluna "Tutti Qui", em O LIBERAL, que o último quintal de Belém brevemente vai virar mais uma "torre de marfim", aliás, desculpem, de tijolo, cimento, ferro, vidro e aço... O Palacete Faciola, na Almirante Barroso, é o "último dos moicanos". O imóvel ocupava imensa área verde, incluindo o enorme quintal, um verdadeiro sítio dentro da cidade. Foi desapropriado pela Prefeitura de Belém, na gestão do Edmilson, que ali pretendia construir um asilo para doentes mentais... Quem sabe não seria o caso de "internar" ali os autores dessa insana transação imobiliária! Derrubaram toda a imensa área verde para erguerem mais três torres tórridas. De torre em torre, a cidade vai crescendo verticalmente, em ritmo frenético, com a construção desvairada de novas muralhas de cimento e aço, que estão "matando" os pulmões da cidade. Até quando iremos assistir, impassíveis, à destruição da vida na cidade, que vai se transformando em imensa ilha de calor? Um dos últimos "sítios" de Belém, também destruído sem dó nem piedade, foi o da casa que pertenceu à professora Anunciada Chaves, que se orgulhava de receber os amigos e alunos em seu belo quintal, na Rui Barbosa com Boaventura, em memoráveis tertúlias literárias, onde se respirava oxigênio, inteligência e cultura. Sabem o que surgiu em seu lugar ? Um prédio de seis andares que abriga hoje a sede da Associação dos Defensores Públicos Federais. Pasmem, os defensores federais não conseguiram evitar aquele crime ambiental e até desfrutam hoje de uma sede construída sobre os destroços daquele que foi um dos mais belos quintais de Belém... Pobre Belém ! Outro "sítio" dentro da cidade, também destruído pelas picaretas da insensibilidade, foi o antigo Palacete Chermont, na Governador José Malcher com Almirante Wandenkok. Também tinha um belo quintal, cheio de árvores frutíferas. Lembro que escrevi, na época, um artigo inflamado em O LIBERAL, clamando ao Ministério Público do Meio Ambiente (?) que fizesse "alguma coisa" para evitar mais esse crime ambiental contra Belém. Não houve retorno. Também pudera... Era julho em Belém. A cidade estava vazia. Clima favorável à prática de delitos com a tranquilidade dos que têm certeza de que ficarão impunes. Os "fiscais da Lei" também vão à praia, em merecidas e dobradas férias... No caso do Palacete Chermont, o crime foi anunciado. Nas caladas da noite, alguns "agentes", empunhando picaretas, derrubavam as paredes do velho prédio para evitar que ele fosse "tombado". Na verdade, acabou tombando, levando não só mais um pedaço do verde, mas também as esperanças daqueles que ainda acreditavam em alguma providência das "autoridades ditas competentes"... E assim a cidade vai "crescendo". De torre em torre, Belém vai ficando totalmente "asfixiada", porque o vento que vem da natureza exuberante que a rodeia vai sendo aos poucos impedido de entrar na cidade pelas "muralhas" erguidas pela ambição desvairada e pela insensibilidade abissal dos empreiteiros, incorporadores e vendedores de sonhos consumistas, que acabam destruindo as "pontes" com a natureza e a vida. Parodiando o livro famoso "Por quem os sinos dobram", de Ernest Hemingway, diria que os sinos também dobram pelos insensatos filhos de Belém que, em nome de um falso progresso, estão destruindo, junto com as áreas verdes, a bela cidade em que vivemos e amamos. Ai de ti, Belém, se não reagires a tempo de evitar o pior, ou seja, que todos os teus filhos acabem sendo devorados pelo calor insuportável e pela omissão dos que podem fazer alguma coisa para evitar essa tragédia anunciada e se refugiam em suas ilusórias "ilhas de conforto"... Até quando ?"

sexta-feira, 21 de novembro de 2014

Vergonha

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que recentemente se disse envergonhado com as denúncias de corrupção na Petrobrás, parece não ter sentido a mesma vergonha com as denúncias de corrupção no seu governo. Suas bochechas sequer coraram quando, usando a sua maioria no Congresso Nacional, sufocou as CPIs destinadas a apurar as denúncias, inclusive sobre a compra de votos para aprovação da emenda da reeleição. A manchete da “Folha de São Paulo”, de 20 de maio de 1997, diz tudo:”Governo faz blitz para barrar CPI”. Consultando-se o registro na imprensa dos oito anos do governo FHC constata-se um estarrecedor volume de corrupção que a mídia, por mais se esforçasse, não conseguiu esconder. Entre outros um rombo de R$ 2 bilhões na Sudam; desvio de R$ 1 bilhão e 400 milhões da Sudene; escândalos Marka-FonteCindam, Sivam e Proer; desvio de R$ 4 milhões e 500 mil do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador); denúncias de caixa dois nas campanhas presidenciais de 1994 e 1998, etc. Provocado a comparar os governos FHC e Lula, o senador Roberto Requião disse: “A gente nem precisa de um roubômetro para avaliar isso. O Fernando Henrique com a privataria roubou 10 mil vezes mais do que qualquer possibilidade de desvio do governo Lula”. A fúria privatizacionista do governo FHC, que incluiu a Vale do Rio Doce, uma das maiores mineradoras do mundo, pretendia alcançar a Petrobrás, o Banco do Brasil e a Caixa Econômica, o que não aconteceu porque Lula foi eleito e impediu que o Brasil fosse inteiramente leiloado. Antes de deixar o Planalto, no entanto, FHC deu partida ao processo de privatização da Petrobrás, quebrando o monopólio de exploração e refino do petróleo através da lei 9.478, que revogou a lei 2.004 sancionada por Getulio Vargas, que criou a empresa; demitindo cerca de 40% dos seus funcionários e tentando mudar o seu nome para Petrobrax, que soava melhor aos ouvidos dos investidores estrangeiros e possíveis compradores. Além disso, no período de 1999 a 2001, sob a gestão de Reichstul, houve uma série de acidentes graves – 62 no total, incluindo o naufrágio da Plataforma P-36 e vazamentos de óleo no Rio de Janeiro e no Paraná– provocando suspeitas de sabotagem. Na época, o presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobrás, Fernando Leite Siqueira, disse que na sua opinião esses acidentes “tinham a função de jogar a empresa contra a opinião pública para justificar a sua desnacionalização”. Comparando o tratamento dado à empresa pela ditadura e pelo governo FHC, o presidente da Aepet afirmou que os militares foram melhores: “O governo militar teve erros crassos na área de direitos humanos, mas eram nacionalistas. O Geisel foi presidente da Petrobrás e deu todo apoio à empresa”. Na verdade, eles ainda não desistiram de entregar a Petrobrás ao capital estrangeiro, seguindo o pensamento de Fernando Henrique exposto na época no livro “Dependência e Desenvolvimento da América Latina”, onde defendeu a tese de que países em desenvolvimento ou atrasados poderiam desenvolver-se mantendo-se dependentes de países ricos, como os Estados Unidos. A campanha criminosa que se desencadeou contra a Petrobrás, usando como pretexto as denúncias de corrupção investigadas pela Policia Federal – como se a empresa tivesse culpa disso – tem o objetivo de desvalorizá-la, facilitando a sua desnacionalização, pois os grandes grupos econômicos internacionais há tempos estão de olho nela. Prova disso é que as ações da maior empresa estatal brasileira, com mais de 80 mil funcionários e dando lucros com a continuidade de suas operações normais, vem caindo nas bolsas de valores, especialmente no Brasil e Nova York. Segundo o Ministério Público, o esquema de corrupção na Petrobrás não é de agora, mas funciona há mais de 15 anos, ou seja, desde o governo de Fernando Henrique.“Muito embora não seja possível dimensionar o valor total do dano – disse o MP – é possível afirmar que o esquema criminoso atuava há pelo menos 15 anos na Petrobrás”. Essa notícia foi publicada terça-feira última, meio escondida, pelo jornal “O Estado de São Paulo”. Agora, no entanto, esse velho esquema está sendo investigado, graças ao governo da presidenta Dilma Roussef, que está dando todo apoio ao trabalho da Policia Federal. Na verdade, todo o povo brasileiro está apoiando as investigações, considerando a necessidade de por tudo em pratos limpos e punir os responsáveis. Ao ser eleito em 1994 o sociólogo Fernando Henrique chegou a proclamar que a sua missão era “por fim à era Vargas”, justamente a era em que foram criadas as maiores empresas estatais brasileiras. Vale a pena transcrever, a propósito, um trecho da carta-testamento de Vargas, deixada no seu leito de morte:”A campanha subterrânea dos grupos internacionais aliou-se à dos grupos nacionais revoltados contra o regime de garantia do trabalho. A lei de lucros extraordinários foi detida no Congresso. Contra a justiça da revisão do salário mínimo se desencadearam os ódios. Quis criar liberdade nacional na potencialização das nossas riquezas através da Petrobrás e, mal começa esta a funcionar, a onda de agitação se avoluma. A Eletrobrás foi obstaculada até o desespero. Não querem que o trabalhador seja livre. Não querem que o povo seja independente”. O candidato tucano Aécio Neves pretendia dar continuidade à política entreguista de Fernando Henrique, seu guru, e o mais claro sinal disso foi a escolha de Arminio Fraga para seu Ministro da Fazenda, caso eleito. Fraga, que tem dupla cidadania (brasileira e americana) e antes de ser presidente do Banco Central no Governo FHC foi diretor-gerente do Soros Fund, do mega especulador George Soros, em Wall Street, falando na época a banqueiros e empresários em Nova York, além de criticar severamente o então governador mineiro Itamar Franco, por ter se rebelado contra as medidas entreguistas de FHC, aconselhou os investidores a não investirem em Minas Gerais. Foi justamente esse homem, que trabalhou contra os interesses de Minas, que o mineiro Aécio queria no seu Ministério da Fazenda. Ainda bem, para o Brasil e, em especial, para Minas, que ele não foi eleito. Todas essas informações estão no livro “O príncipe da privataria”, do jornalista Palmério Dória, que, por motivos óbvios, não tem lugar na livraria da “Folha”. O editor Luiz Fernando Emediato, na apresentação do livro, diz que quando terminou a sua leitura, “em certo momento estupidificados, seremos obrigados a nos perguntar: onde estava, no reinado dos tucanos, o Ministério Público, o Procurador Geral da República, os Joaquim Barbosa daquele tempo? O chamado “mensalão” – tenha existido ou não – parece coisa de amadores diante do profissionalismo de empresários, burocratas e políticos daquele tempo. Nenhuma CPI. Nenhuma investigação que chegasse ao fim. Nenhuma denúncia capaz de levar a um processo e a uma condenação!”

quarta-feira, 19 de novembro de 2014

Cheiro de golpe

É surpreendente a capacidade de distorção dos fatos, pela grande mídia, para tentar desqualificar as ações do governo. A ordem do ministro da Justiça para investigar os delegados da Operação Lava-Jato não teve como causa a crítica que eles fizeram à presidenta Dilma Roussef e ao ex-presidente Lula ou à sua preferência pela candidatura de Aécio Neves, mas à suspeita de que foram eles os responsáveis pelo vazamento seletivo dos depoimentos sigilosos da delação premiada, com o objetivo de beneficiar o seu candidato à Presidência da República. Como servidores públicos, eles não podiam usar informações privilegiadas para atender suas preferências político-partidárias. Tenta-se agora, criminosamente, atribuir a decisão do ministro a uma tentativa do governo de abafar a Operação Lava-Jato, impedindo o prosseguimento das investigações sobre as denúncias de propinas na Petrobrás. E muita gente nas redes sociais, por falta do uso do cérebro, acreditou nessa versão. Ora, basta um mínimo de raciocínio para saber que a Policia Federal é um órgão do governo, subordinado ao Ministério da Justiça, e, portanto, só está realizando seu trabalho sem qualquer restrição porque o governo lhe deu autonomia e quer tudo apurado para punir os responsáveis. Se o governo pretendesse impedir as investigações já o teria feito no início do inquérito, a exemplo do ex-presidente Fernando Henrique, que nunca deixou que as denúncias de corrupção no seu governo fossem investigadas. O candidato derrotado à Presidência, Aécio Neves, no entanto, na mesma linha da mídia, divulgou nota no sábado, na qualidade de presidente do PSDB, reiterando “a posição de defesa intransigente da rigorosa apuração do maior escândalo de corrupção da história do país, através da Operação Lava-Jato”. Confirmando a sua esperteza, ele tenta convencer os desavisados de que é o seu partido que quer a apuração dos fatos. Ora, todo mundo sabe que todo o povo brasileiro – e não apenas os tucanos – quer que as denúncias sejam apuradas e os responsáveis punidos. E o governo federal também. A presidenta Dilma Roussef declarou de Brisbane, na Austrália, onde foi participar da reunião do G-20, que “não ficará pedra sobre pedra” nessas investigações. E lembrou: “É o primeiro escândalo de nossa história que é investigado”. O esperto Aécio continuou em sua nota, com seus conhecidos sofismas, dizendo que ”o PSDB lamenta que neste momento o Governo Federal, através de suas autoridades, insista em tentar dar um tratamento político a um caso que é, eminentemente, de polícia”. É muita desfaçatez. Foi justamente ele que desde o início politizou as investigações, com a decisiva ajuda da mídia, usando os vazamentos seletivos como arma eleitoral para tentar mudar o voto dos eleitores. E agora tenta usar as mesmas investigações como justificativa para um impeachment da Presidenta, ao afirmar que “tão importante quanto responsabilizar os diretores da Petrobrás (...) é identificar e punir os agentes públicos que permitiram o irresponsável aparelhamento da companhia e criaram as condições necessárias para a expropriação de recursos públicos, para dele se beneficiarem direta ou indiretamente”. Depois do editorial de domingo do jornal “O Estado de São Paulo”, sob o título de “Crime de responsabilidade”, na mesma linha de argumentação usada pelo senador tucano, ninguém mais tem dúvidas de que o golpe está em andamento, numa ação articulada que envolve figuras de vários setores. Após afirmar que Lula sabia e que Dilma participou dos fatos sob investigação, o “Estadão” propõe que “devem todos os envolvidos no escândalo pagar pelo que fizeram – ou não fizeram”. É preciso ser mais claro? O poeta Ferreira Gullar também embarcou nessa, por ingenuidade ou senilidade, igualmente propondo o impeachment de Dilma ao dizer que “não se trata de buscar soluções antidemocráticas mas, sim, mudar para preservar a democracia”. Será que existe alguém tão imbecil – ou ingênuo – para acreditar que derrubando um governo legítimo, sem nenhum respaldo constitucional, estará exercitando a democracia? O fato é que já se percebe claramente um clima de golpe no país, com a orquestração de manifestações de rua, declarações de políticos e editoriais da imprensa comprometida sinalizando o próximo passo para tentar arrancar Dilma do Palácio do Planalto. Cinicamente invoca-se a democracia para afrontar a vontade dos 54 milhões de brasileiros que a reelegeram. E a Presidenta, talvez sem atentar ainda para a dimensão perigosa da conspiração, disse da Austrália que “o Brasil tem uma situação democrática consolidada e, por isso, faz parte da nossa história tolerar as manifestações, mesmo as mais extremas”. Ela está subestimando o poder da extrema direita, que tem hoje como principal expoente no Brasil o candidato derrotado Aécio Neves. E se não mobilizar urgentemente as suas forças, botando o povo nas ruas para defender o seu mandato, vai correr o sério risco de não emplacar o segundo governo. Aécio Neves não se conforma com o resultado das eleições e sonha conquistar o poder, de qualquer maneira, para leiloar o resto do Brasil, tarefa iniciada por FHC durante o seu governo. A privatização da Petrobrás, que o ex-presidente tucano não conseguiu porque estava em final de mandato, é a principal meta a ser alcançada. Não foi por acaso que ele quebrou o monopólio do petróleo e dividiu a Petrobrás em subsidiárias. E não é por acaso que se procura hoje desvalorizar a maior empresa estatal brasileira, usando-se as denúncias de corrupção como pretexto para justificar a sua desestatização. Vale a pena lembrar o que disse o jornalista Mauro Santayana no livro “O Príncipe da Privataria”, do jornalista Palmério Dória: “O que temos de ficar atentos é que FHC não é só FHC. Ele é todo um grupo, um conjunto de interesses contra a nação brasileira”. Não é por acaso, portanto, que Aécio o tirou do sarcófago para transformá-lo em seu guru.

segunda-feira, 17 de novembro de 2014

Discriminação

Do aposentado Cândido Leal Messias, do Banco da Amazônia, recebo a seguinte nota, que subscrevo integralmente: "Quando os bancos promovem seu marketing em cima de produtos e serviços para clientes não costumam separá-los por classes. Até porque, como diz um brocardo popular - "dinheiro não tem pátria nem cor". E os bancos lucram cada vez mais emprestando dinheiro para os seus clientes, em "suaves" prestações mensais. Há casos em que o cliente também sai satisfeito porque pode dispor de um S.O.S básico para despesas emergenciais, pagar dívidas, etc. Mas no Banco da Amazônia está ocorrendo uma situação inusitada: eles anunciam no painel dos caixas eletrônicas a antecipação do 13º salário para clientes, mas não especificam se há alguma exceção. Quando, porém, o aposentado do Basa/Capaf vai solicitar esse produto ouve uma resposta curta e grossa do gerente: "infelizmente o sistema não liberou essa opção de crédito para aposentados." Não adianta argumentar que os clientes de um banco, em princípio, deveriam ter os mesmos direitos desde que cumpram com suas obrigações. Não adianta também invocar o Estatuto do Idoso, que prescreve com todas as letras "que o idoso não deve ser submetido a maus tratos ou tratamento discriminatório". O sistema não costuma se sensibilizar com essas filigranas de ordem legal. A diretoria do Banco da Amazônia, em tese composta de representantes do Partido dos Trabalhadores (PT) continua tratando os aposentados da CAPAF com sucessivas retaliações devido a não terem aderido em peso aos Planos Saldados da CAPAF, que suprimia direitos e atropelava sonhos de uma vida mais digna na velhice. A antecipação da primeira parcela do 13º, consagrada pelos usos e costumes por mais de 40 anos, também foi suspensa para aposentados desde a intervenção na CAPAF, decretada em 2011. Diferenças do reajuste salarial de setembro também não são pagos aos aposentados na data paga aos funcionários da ativa, numa escandalosa discriminação. Enquanto isso, a Ação impetrada pela AABA para garantir os direitos de aposentados e pensionistas já foi vitoriosa em todas as instâncias da Justiça Trabalhista, até no TST, mas a PREVIC (órgão do governo federal que supervisiona os Fundos e Pensão) já anunciou a disposição do governo em remetê-la "aos costumes" , ou seja, insistir em recursos meramente protelatórios ao STF para ver se lá ela possa ser esquecida nos porões com milhões de outros processos até que todos os aposentados e pensionistas possam morrer e com eles sua esperança e seus sonhos. Será que o senador Paulo Rocha, que honrando suas origens como trabalhador gráfico, sempre defendeu o lado dos trabalhadores, inclusive como atuante dirigente sindical e fundador da CUT - não pode se interessar pela causa dos aposentados do Banco da Amazônia, que estão sendo massacrados pela diretoria indicada pelo Partido dos Trabalhadores, através de mesquinhas atitudes de retaliação e vingança ? Posso garantir que foram muitos os aposentados do Basa que votaram em Paulo Rocha. Bem que ele agora poderia dar uma "forcinha" aos velhinhos do Basa, rechaçando essa postura autocrática da atual diretoria do Banco da Amazônia e conseguindo , através de negociações em Brasília, que a PREVIC desista dessa postura arrogante e boçal de recorrer de causas perdidas, apenas aumentando o passivo trabalhista a ser um dia liquidado de qualquer maneira , com maiores prejuízos para o governo federal e para o Basa".

domingo, 16 de novembro de 2014

Conspiração

Será que somente o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, não suspeitava de onde saíam os vazamentos seletivos da Operação Lava-Jato, que alimentaram a imprensa durante a campanha eleitoral com o objetivo de influenciar o resultado do pleito? Qualquer pessoa de inteligência mediana concluiria que as informações só poderiam sair de alguém presente nos depoimentos dos premiados pela delação, tidos como sigilosos, mas nunca houve qualquer providência dos chefes das investigações, incluindo o juiz, para identificar e punir o responsável ou, pelo menos, impedir os rotineiros vazamentos. Era o óbvio ululante. E a complacência assumiu contornos de conivência. Foi preciso que o jornal “O Estado de São Paulo”, na última quinta-feira, denunciasse o comportamento político dos delegados federais responsáveis pela operação, xingando a presidenta Dilma Roussef e o ex-presidente Lula e fazendo a propaganda de Aécio Neves nas redes sociais, para que o ministro determinasse uma investigação à Corregedoria Geral da Policia Federal. “Não podemos admitir a partidarização de nenhuma investigação”, ele disse, acrescentando: “A manifestação é livre, mas um delegado não pode conduzir uma investigação parcialmente, pelas suas convicções íntimas, nem divulgar informações sigilosas”. Essa providência, na verdade, deveria ter sido tomada desde o primeiro vazamento, que, sob os olhares atônitos dos brasileiros, virou rotina durante a campanha eleitoral, abastecendo de pólvora a mídia oposicionista para continuar atirando contra a candidatura da presidenta Dilma. Surpreendentemente, o governo assistiu apático a essa prática visivelmente destinada a influenciar a decisão dos eleitores, que culminou com a escandalosa reportagem de capa da revista “Veja”às vésperas do pleito, a última cartada para impedir a reeleição de Dilma, que liderava as pesquisas de intenção de votos. Não deixa de ser sintomático, por outro lado, a presteza com que procuradores da República divulgaram nota de “confiança e apoio” aos delegados que trabalham na Operação Lava-Jato, afirmando que “em nosso país, expressar opinião privada, mesmo que em forma de gracejos, sobre assuntos políticos é constitucionalmente permitida”. Não há dúvida de que qualquer brasileiro tem todo o direito de expressar suas simpatias ou antipatias a qualquer candidato a um mandato eletivo, mas o servidor público, especialmente aquele que ocupa um cargo onde o profissionalismo e a isenção são fundamentais para o seu exercício, como magistrados e policiais federais, por exemplo, não podem manifestar publicamente suas preferências políticas, pois isso compromete a confiabilidade do seu trabalho. Sem esquecer os estatutos e regimentos que balizam seu comportamento. Ao comentar a matéria do “Estadão”, em artigo publicado no portal “Observartório da Imprensa”, o jornalista e escritor Luciano Martins Costa disse que a reportagem mostra que "os delegados federais responsáveis pela Operação Lava-Jato compunham uma espécie de comitê informal do candidato Aécio Neves à Presidência da República enquanto vazavam seletivamente para a imprensa dados do inquérito". Ele acrescenta que a revelação expõe "a perigosa contaminação de toda uma superintendência regional da Polícia Federal por interesses externos ao da atividade policial, o que coloca em dúvida a qualificação de seus agentes para conduzir essa investigação, e, por consequência, de todo o noticiário que se seguiu". Vale recordar que no seu governo o presidente Fernando Henrique Cardoso agia com rigor nessas situações, só que ao invés de mandar apurar os fatos denunciados determinava fosse o denunciante investigado. E quando as investigações se aproximavam do Palácio do Planalto trocava o diretor geral da Policia Federal. Ao contrário de FHC, a presidenta Dilma Roussef tem assistido aos vazamentos, criadores de factóides que causam enormes prejuízos ao seu governo, sem uma reação mais vigorosa, capaz de inibir a ação deletéria dos seus adversários que, hoje, autotransformados em inimigos, estão disseminados por toda parte. Percebe-se, sem muita dificuldade, que a conspiração vem ganhando corpo e cercando o Palácio do Planalto. E enquanto os conspiradores agem nas sombras, infiltrados até no Judiciário, os seus líderes intensificam suas ações no Congresso Nacional, onde o principal acólito do candidato derrotado Aécio Neves, o deputado Carlos Sampaio, afirmou que vão infernizar a vida da presidenta Dilma, que não terá paz durante o seu segundo mandato. ”O povo quer de nós vigilância e fiscalização implacáveis sobre esse governo. Não daremos espaço”, ele disse. Constata-se que está em marcha uma udenização do PSDB, com o conseqüente ressurgimento do lacerdismo, onde o que está em jogo não é o interesse do país, mas o poder. Pretende-se conquistar o poder a qualquer preço, mesmo com o sacrifício da própria democracia. Será que Aécio e sua turma imaginam que um golpe lhes daria, na bandeja, o poder que não conquistaram nas urnas? As manifestações de rua que pediram a volta dos militares ao poder, como parte do processo conspiratório, ainda ecoam em ouvidos aparentemente moucos. O silencio dos quartéis pode ter várias interpretações, mas nunca é demais lembrar que os trabalhos da Comissão da Verdade provocaram irritação em altas patentes militares. O fantasma do comunismo, que hoje não assombra mais ninguém, foi substituído pelo bolivarianismo, uma tolice de quem não sabe o que Simon Bolívar representou para a América do Sul. Mas não se deve subestimar o poder das chamadas forças ocultas, internas e externas, que estão atuando intensamente com o decisivo apoio da grande mídia. A reportagem do “Estadão” , portanto, deve servir de alerta ao Palácio do Planalto para o panorama que se desenha no país. Afinal, cautela e caldo de galinha nunca fizeram mal a ninguém.

sexta-feira, 14 de novembro de 2014

Intolerância

As sementes da intolerância, lançadas pela grande mídia ao longo do mandato da presidenta Dilma Roussef, encontraram terreno fértil nas redes sociais, onde germinaram e cresceram e estão produzindo o seu pior fruto – o ódio. Contaminada por ele, muita gente – inclusive pessoas de nível de instrução superior, como jornalistas e médicos – perdeu o equilíbrio e, em seus comentários, não se limita a criticar o que não concordam, preferindo descambar para o insulto e a ofensa, empregando inclusive palavrões. Deixaram de ser os “aloprados”, segundo definição do jornalista Ricardo Kotscho, para se transformarem em doentes raivosos, que babam e destilam veneno. Estimulados por conhecidos colunistas dessa grande mídia, como Arnaldo Jaborto, Reinaldo Azevedo, Diogo Mainardi e Rodrigo Constantino, entre outros, verdadeiros arautos da intolerância, os intolerantes internautas disseminaram de tal modo o ódio que acabaram transformando as redes sociais num esgoto virtual, onde despejam seus dejetos verbais, sendo compartilhados por anencéfalos que se assemelham àquele besouro popularmente conhecido como rola-bosta. E o mais absurdo: dirigiram o seu ódio contra os nordestinos, simplesmente porque foram estes brasileiros que garantiram a reeleição da presidenta Dilma Roussef. Com feições apopléticas de raiva, destilando ódio por todos os poros, o maluco beleza Arnaldo Jaborto dá o exemplo de intolerância, descarregando a sua bílis nos eleitores de Dilma, em especial os nordestinos, que ele classifica de “burros” e “analfabetos” simplesmente porque não pensam como ele e derrotaram o seu candidato Aécio Neves. O médico Walter Abreu, de Poços de Caldas, segue o seu exemplo e, no facebook, chama os nordestinos de “antas” e os mineiros de “burros”. Ou seja, para eles “burros” e “antas” são todos os brasileiros que não rezam por sua cartilha ou, mais precisamente, pela cartilha dos ricos e poderosos, que não se conformam com a ascensão dos pobres e humildes promovida pelos governos do PT. Em Manaus, segundo revelou o jornalista Eduardo Guimarães no “Blog da Cidadania”, a médica Patricia Sicchar, da Secretaria Municipal de Saúde, e o seu colega Lano Macedo, do Hospital Beneficente Portugues do Amazonas, decidiram utilizar as redes sociais para lançar campanhas contra os que ajudaram a reeleição da Presidenta. Patrícia propôs que os nordestinos sejam castrados quimicamente para que não se reproduzam (é surpreendente o tamanho do ódio dessa médica), e Macedo exorta os seus colegas médicos a boicotarem os laboratórios que contribuíram com recursos para a campanha de Dilma. Constata-se hoje que o oponente político deixou de ser adversário para transformar-se em inimigo, contra quem vale tudo, até a castração. Esse comportamento primitivo, até então impensável entre pessoas instruídas, é fruto da disseminação do ódio por parte da imprensa oposicionista. A pesquisadora Ivana Bentes, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, classificou esse jornalismo de “ódiojornalismo”, apontando a revista “Veja” como uma das principais responsáveis por essa prática, junto com alguns conhecidos colunistas. Na sua opinião, esses colunistas formam uma “tropa de choque” ulraconservadora que “alimenta uma fábrica de memes de ultra direita que se instalou e trabalha para minar projetos, propostas, seja de programas sociais, seja de ampliação dos processos de participação da sociedade nas políticas públicas, seja de processos de democratização da mídia e todo o imaginário dos movimentos sociais”. A professora Ivana destaca ainda que se constata hoje, na leitura dos jornais, “um altíssimo grau de discursos demonizantes, raivosos e de intolerância, à direita e agora também à esquerda”. Esses discursos, que caracterizam o comportamento principalmente de perdedores nas eleições de outubro último – entre eles os senadores Aécio Neves e Aluizio Nunes, também arautos da intolerância – encontraram ressonância nas redes sociais, onde muitos internautas se escondem no anonimato para dar vazão ao seu ódio e frustrações, enquanto outros já nem se preocupam em esconder a cara, como é o caso, por exemplo, da atriz e jornalista Déborah Albuquerque, que chamou os eleitores de Dilma de “imbecis e miseráveis” e, dizendo-se rica e bem sucedida, se prepara para mudar-se para Orlando. Já vai tarde. Por conta dessa intolerância, evidenciada em declarações racistas e discriminatórias contra o povo nordestino, é que o jornalista Diogo Mainardi, da “Veja”, está sendo processado pela OAB de Pernambuco e por vários deputados federais, que representaram contra ele na Procuradoria Geral da República. Afinal, por que tanto ódio contra os nordestinos? Só porque exerceram o seu direito de voto? Se todas as pessoas adotassem o mesmo comportamento, odiando os que não apóiam os mesmos candidatos, as eleições se transformariam numa verdadeira guerra, inclusive com mortes, uma estupidez sem limites. A grande virtude da democracia é justamente permitir que as diferenças convivam pacificamente. Mas para isso as pessoas precisam ser civilizadas.

quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Mudança na Justiça

Recentemente a televisão noticiou que a agente de trânsito Luciana Tamburini, do Rio, foi condenada pelo Tribunal de Justiça a pagar multa de R$ 5 mil por ter autuado o juiz João Carlos de Souza Correia, que dirigia sem documentos um carro sem placa. O magistrado deu-lhe voz de prisão quando ela lembrou-o que ele “era juiz e não Deus”. Por conta disso Luciana foi acusada, pela Justiça carioca, de “abuso de autoridade”. O Tribunal , pelo visto, interpretou a observação da agente como uma ofensa ao juiz, quando, na verdade, o ofendido foi Deus, que é justo e bom. Ninguém precisa ser versado em leis – basta ter bom senso – para concluir que quem abusou da autoridade foi o juiz, que tem o dever legal e moral de cumprir e fazer cumprir a legislação. Vergonhosamente, porém, foi ele o infrator. E mais vergonhoso ainda, além de surpreendente: a sua atitude ganhou o aval da Corte de Justiça do Rio. Em editorial sob o título de “Autoridade abusada”, a “Folha de São Paulo” disse que “do episódio ressalta o contraste entre dois modelos de organização social: um arcaico, em que a aplicação das leis varia segundo o status de quem nelas se vê enredado, e outro em que todo cidadão é tratado igualmente, em seus direitos e deveres, pelo Estado”. Além desse aspecto negativo, que revela corporativismo, lamentavelmente tem-se observado, nos últimos tempos, uma mudança de comportamento entre membros do Judiciário, que se tornaram mais políticos do que magistrados. O mais recente exemplo disso foi a declaração do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, que desceu das suas tamancas para questionar o direito constitucional da presidenta Dilma Roussef de nomear os membros daquela Corte e , também, para defender o candidato derrotado Aécio Neves das críticas do ex-presidente Lula. Antes dele, o ministro Joaquim Barbosa já havia transformado o STF num palco político para influenciar o processo eleitoral. O julgamento do chamado “mensalão”, montado para atingir figurões do Partido dos Trabalhadores e contribuir para a derrota dos seus candidatos com a mais ampla cobertura da grande imprensa oposicionista, foi condenado pelos mais importantes juristas brasileiros, por conter vícios gritantes. Barbosa, transformado em celebridade por fazer justamente o que a mídia comprometida queria, estribou-se, por falta de provas, na teoria do domínio do fato, de origem alemã, para condenar os réus. A partir daí alterou-se a máxima jurídica de que “todos são inocentes até prova em contrário” e o ônus da prova passou a ser não mais de quem acusa, mas do acusado. Como no momento fala-se muito em reforma política, com cobrança diária à Presidenta, seria saudável que se providenciasse, também, uma reforma no Judiciário, de modo não apenas a conter o ímpeto político de magistrados (quem pretende ingressar na política deve deixar a toga e filiar-se a um partido, como fez a ministra Eliana Calmon e o governador eleito do Maranhão, Flavio Dino, que era juiz federal) e, também, tornar mais cristalina a posição do poder judiciário em relação aos outros poderes. Tem-se a impressão, hoje, de que o Judiciário está acima dos demais poderes da República, porque com uma canetada um único ministro consegue anular ou mudar decisões, por exemplo, do Congresso Nacional, que é o poder representativo do povo, de onde, segundo a Constituição, emana todo o poder. A Constituição Federal estabelece que os poderes são independentes e harmônicos entre si mas na prática não é o que tem sido observado. O ministro Gilmar Mendes, por exemplo, tem usado frequentemente seu superpoder para mudar decisões do Parlamento Nacional, que tem um colegiado de mais de 500 membros eleitos pelo povo. E mesmo sem indicar o dispositivo legal que lhe concede esses poderes, ele já decidiu, solitariamente, anular até decisão adotada por unanimidade pelo Tribunal Superior Eleitoral, que é presidido e integrado por seus colegas do STF. E há vários meses está sentado sobre o processo que trata do financiamento de campanhas eleitorais, do qual pediu vistas. O Poder Legislativo, o Congresso Nacional, que faz as leis, deveria também aproveitar a oportunidade para um ajuste na lei 8072, de 1990, que estabeleceu a delação premiada e que, segundo o jurista Dalmo Dallari, “promoveu o delinqüente a agente público informal”. Em artigo publicado no “Jornal do Brasil” o jurista destaca que “criminosos confessos se utilizam espertamente da delação premiada para atenuar a punição merecida e legalmente prevista”, causando graves prejuízos de várias espécies “às vítimas de uma delação que não corresponda à verdade e que tenha sido inventada por alguma conveniência do delator”. Depois de lembrar que “nos últimos tempos, por motivação político-eleitoral mais do que óbvia, vários setores da imprensa deram grande destaque a criminosos confessos que acusaram personalidades públicas, explorando os termos de uma delação premiada”, Dallari adverte para as graves distorções dessa prática de duvidosa conveniência, defendendo ao mesmo tempo uma “urgente reavaliação” da sua aplicação “para excluí-la das práticas legais ou, pelo menos, para disciplinar com mais rigor sua utilização, em beneficio da sociedade”. Pressupondo-se que o desejo de todos, incluindo a oposição, é melhorar o Brasil, esse é o momento do Congresso deixar de lado as picuinhas políticas e dedicar-se, efetivamente, ao aperfeiçoamento das leis que permitam o avanço do nosso país nos mais diferentes setores da vida nacional. A hora é esta.

domingo, 9 de novembro de 2014

Já vão tarde

Desgostosos com a reeleição da presidenta Dilma Roussef muita gente da classe alta, especialmente do Rio e São Paulo, está deixando o Brasil para morar nos Estados Unidos. Entre os que “desistiram do Brasil” está a atriz e jornalista Deborah Albuquerque, que chamou os eleitores de Dilma de “imbecis e miseráveis” e declarou-se “rica e bem sucedida”. Ela está de mudança para Orlando. Muitos estão se transferindo para Miami. Já vão tarde. Deveriam levar junto o cantor Lobão, que ameaçou também deixar o País e lamentavelmente depois decidiu ficar, e todos os que não se conformam com a vitória da Presidenta e insultam os nordestinos nas redes sociais, acusando-os como responsáveis pela derrota de Aécio Neves. Uma médica de Manaus chegou a sugerir a “castração química dos nordestinos”, o que pode significar que, além da frustração pela derrota do seu candidato, ela também tenha algum trauma sexual com um filho do Nordeste. Alguém, no entanto, precisa dizer a ela que a gente vota é com os dedos, apertando as teclas da urna eletrônica.

Desconfiança

O deputado Eduardo Cunha, do PMDB, que articula a sua eleição para a presidência da Câmara Federal desafiando o Palácio do Planalto, declarou recentemente que se for eleito para o comando da Casa vai engavetar a proposta de regulação da mídia, que deverá ser encaminhada pelo Executivo no início do próximo ano. Ocorre que nem o Planalto ou a mídia confiam nele. O governo não confia porque ele adotou um comportamento oposicionista antes mesmo das eleições presidenciais, embora integrando o partido da base aliada, e apoiou a candidatura de Aécio Neves. E a mídia também não confia nele porque ele tem 51 ações na Justiça contra jornais do Rio, São Paulo e Brasilia. Dessas ações ele já perdeu 28 e ganhou três, enquanto as outras continuam tramitando. A informação é da “Folha de São Paulo”.

sábado, 8 de novembro de 2014

Malabarismo

Deve-se reconhecer que o senador Aécio Neves é um exímio manejador de palavras, qualidade que revelou ao país durante a campanha eleitoral. Essa habilidade, que lhe permitiu durante os debates fugir das perguntas – e transferir para os petistas a pecha de mentirosos e infames – transformou-o num grande sofista, capaz de torcer a seu favor os fatos mais desfavoráveis. Nesta última terça-feira, no entanto, ele se superou ao afirmar que “perdeu vencendo”, enquanto Dilma “venceu perdendo”. Essa acrobacia verbal, por mais incrível que possa parecer, acabou convencendo um magote de cabeças de vento de que ele foi, efetivamente, o grande vencedor das eleições de 26 de outubro último. O candidato derrotado à Presidência da República reapresentou –se ao Senado em grande estilo, como se fosse realmente o vitorioso, assediado por militantes tucanos e afirmando que “chego hoje ao Congresso para exercer o papel que me foi delegado pela grande maioria do povo brasileiro – 51 milhões de votos”. E acrescentou: “Vou ser oposição sem adjetivos”. Com seu malabarismo verbal ele continua sofismando: os 51 milhões de votos que recebeu não representam a maioria dos eleitores, pois se assim fosse teria sido eleito. A maioria dos votos foi dada à presidenta Dilma, que foi reeleita com mais de 54 milhões de sufrágios, ela, sim, a grande vencedora. O senador tucano parece ter se convencido de que, por conta da sua votação, passou a ser o grande líder da oposição. Esqueceu que esses votos não foram dados realmente a ele por causa dos seus belos olhos ou dos seus sofismas, mas pelo fato de ter sido o único oponente no segundo turno. Como no Brasil não é o povo que escolhe os candidatos, mas os partidos, os eleitores que não queriam votar em Dilma só tinham ele como opção no segundo turno. Por isso, os que não queriam nem ele ou Dilma, num total de mais de 37 milhões, preferiram votar em branco, anular o voto ou simplesmente não comparecer às urnas. A abstenção foi de 21,10%. Os votos de Aécio foram os que ele recebeu no primeiro turno, ou seja, 34 milhões, menos três milhões do que o número de eleitores que decidiu não votar em ninguém no segundo turno. Isso significa que os 17 milhões de votos que recebeu a mais no segundo turno, portanto metade da sua votação no primeiro, foram de eleitores de Marina Silva em sua grande maioria. A outra parte do eleitorado da ex-senadora acreana preferiu migrar para Dilma, que teve 43 milhões de votos no primeiro turno. O senador mineiro, como é fácil perceber diante desses números, está se arvorando numa liderança que, na verdade, está muito dividida. Percebe-se, ainda, que a diferença de comportamento entre ele e o senador José Serra, também tucano, é bem evidente. Nas eleições presidenciais de 2010 Serra obteve 43 milhões de votos, contra 55 milhões dados a Dilma, mas nem por isso se pavoneou da votação ou se arvorou como líder da oposição. Como único candidato oponente no segundo turno daquele pleito, o senador paulista obviamente, tal como aconteceu este ano com Aécio, recebeu os votos dos que não queriam votar em Dilma. Isso não significa, portanto, que aqueles 43 milhões de votos foram dele, mas do opositor da candidata petista. Na verdade, os votos deles mesmo foram os que receberam para senador: Aécio obteve 7 milhões em 2010, em Minas, e Serra 11 milhões este ano, em São Paulo. Tem-se a impressão, por outro lado, que Aécio, diante dos salamaleques que estão fazendo para ele, acredita ter se credenciado como candidato de novo á Presidência da República em 2018. Não parece difícil prever que ele não conseguirá manter essa posição durante os próximos quatro anos, até porque dentro do seu próprio partido existem outros candidatos em potencial, como o governador Geraldo Alkmin e o senador José Serra que, a exemplo dele, Aécio, também foram derrotados pelo PT. Além deles, a ex-senadora Marina Silva igualmente pretende disputar o Palácio do Planalto naquele ano, montada na votação de 22 milhões que obteve este ano, enquanto o PMDB, rebelado contra a aliança com o PT, já acena com candidatura própria também em 2018. Sem falar em Lula. O cenário para a eleição presidencial naquele ano, portanto, será bem diferente do atual. É preciso levar em conta, ainda, a performance da presidenta Dilma Roussef neste segundo mandato. Se ela fizer um governo ruim estará adubando o terreno para a oposição, que certamente virá muito forte dentro dos próximos quatro anos, mas se, ao contrário do que esperam os profetas do pessimismo, fizer um bom governo, promovendo as reformas reclamadas, mantendo a inflação em baixos níveis, estimulando o crescimento e ampliando os programas sociais terá pavimentado a estrada para Lula. Conclui-se, assim, que Aécio terá de sofismar bastante para, pelo menos, ser ungido novamente pelo seu partido como candidato em 2018. Afinal, o caminho até lá é longo e acidentado.

quinta-feira, 6 de novembro de 2014

Coisas estrranhas

Tem muita coisa estranha – e perigosa – acontecendo no Brasil após a reeleição da presidenta Dilma Roussef. O pesado clima de conspiração criado pelos perdedores apenas uma semana após o pleito, visível principalmente no Sudeste e em Brasilia, deve merecer redobradas atenções da sociedade verdadeiramente democrata, de modo a estancar qualquer tentativa de golpe. O governo e o PT precisam reagir urgentemente contra o movimento golpista que se alastra nas redes sociais e cujos agentes já se fazem visíveis até mesmo na mais alta Corte de Justiça do país. A declaração despropositada do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, questionando o direito constitucional da Presidenta de nomear os substitutos dos ministros que se aposentarão nos próximos quatro anos – ao mesmo tempo insultando seus colegas nomeados pelos governos do PT ao levantar suspeição sobre a isenção de suas decisões – parece parte de um grande esquema, orquestrado pelas forças da direita, para arrancar Dilma do Palácio do Planalto. Descobriu-se agora que aquela boca de desdém de Mendes, que lhe empresta um ar de superioridade e arrogância, na verdade escondia o seu enorme bico de tucano. Indiferente aos prejuízos causados à sua suposta imparcialidade na condição de magistrado, comprometida agora pela posição política assumida publicamente, o ministro tucano estaria articulando com as lideranças oposicionistas no Congresso Nacional a aprovação da chamada “PEC das Bengala”, que amplia de 70 para 75 anos a idade limite para a aposentadoria compulsória dos ministros. O objetivo é impedir que Dilma nomeie mais cinco ministros durante o seu segundo mandato, o que, na opinião de Mendes transformaria o STF num “tribunal bolivariano”. Cabem aqui algumas perguntas diante da estranha declaração de Mendes: qual o gancho que a “Folha” usou como motivo para entrevistá-lo? Se a motivação foi a “PEC da Bengala”, por que, ao invés dele, o jornalão paulista não entrevistou o presidente da Corte, ministro Ricardo Lewandowski, o mais indicado como autoridade maior do Supremo? Não parece difícil concluir que o ministro tucano foi escolhido para falar, como parte do processo destinado a inviabilizar o segundo governo de Dilma, justamente porque já se sabia o que ele diria. E por que justo ele faz articulações junto aos oposicionistas para a aprovação da PEC? Existem mais coisas estranhas acontecendo. O presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministro Dias Tófolli, por exemplo, nomeado pela presidenta Dilma, talvez pressionado pela insinuação do seu colega Gilmar Mendes quanto à possível influência partidária em suas decisões, despachou o pedido de recontagem de votos do PSDB para a Secretaria de Tecnologia do tribunal, buscando respaldar-se em parecer técnico para decidir sobre o destino da ação tucana. Ocorre que o Procurador Geral da República, Rodrigo Janot, já havia se manifestado pelo seu indeferimento diante da “ausência de indícios mínimos de irregularidades”. Janot, aliás, em seu parecer, foi mais além quando diz que o pedido “é de uma imprudência a toda prova, dada a real possibilidade de criar uma situação de instabilidade social e institucional”. Por sua vez o vice-presidente da República, Michel Temer, presidente do PMDB, ao ser indagado sobre o comportamento oposicionista do deputado Eduardo Cunha, do seu partido, que articula a sua eleição para a presidência da Câmara Federal, disse estar tranqüilo quanto à solidez da base aliada no Parlamento, mesmo que Cunha assuma o comando da Câmara. A declaração soa estranha, primeiro porque se a base aliada fosse coesa e sólida Cunha não teria a menor chance de impor a sua candidatura e, segundo, porque todo mundo sabe que um presidente da Câmara desafinado com o Presidente da República pode tornar o país ingovernável, criando todo tipo de obstáculos ao governo, porque é ele quem controla a pauta. Ao mesmo tempo a estranha manifestação que saiu às ruas de São Paulo para pedir o impeachment de Dilma e a volta da ditadura militar, que reuniu pouco mais de mil pessoas portando faixas e cartazes, obviamente não foi um movimento espontâneo, mas parte desse esquemão conspiratório, que tem nos “aloprados das redes sociais”, conforme definição do jornalista Ricardo Kotscho, seus maiores divulgadores. Esses aloprados – coitados! – não sabem o que é uma ditadura. Só falta agora uma “Marcha com Deus pela liberdade” para completar o estranho quadro golpista que muitos fingem que não vêem. Mais estranho de tudo, porém, é a aparente apatia do PT, que ainda não reagiu ao acelerado avanço dos descontentes com a reeleição da presidenta Dilma que, embora com a máquina governamental nas mãos e a maioria dos parlamentares no Congresso Nacional, vem sendo acuada pela minoritária oposição, que não a deixa respirar. O próprio candidato derrotado, Aécio Neves, aliás, já disse que não lhe dará um minuto de trégua. E até agora a revista “Veja” continua impune pelo crime eleitoral praticado às vésperas do pleito e, também, ninguém foi punido pelo vazamento seletivo dos depoimentos “secretos” da operação Lava-Jato. É tudo muito estranho.

terça-feira, 4 de novembro de 2014

Mumia

O bom senso parece que finalmente desembarcou nos principais veículos da chamada grande imprensa que, contrariando procedimentos rotineiros, não deu importância a algumas iniciativas oposicionistas destinadas a desestabilizar o governo da presidenta Dilma Roussef, criando obstáculos à governabilidade do país. Aparentemente os controladores da grande mídia tomaram consciência de que qualquer ação visando a mudança do resultado das urnas, nas eleições de 26 de outubro último, pode descambar para uma situação irreversível de golpe, com enormes prejuízos para todos. Por isso não tomou conhecimento da ação do PSDB pedindo ao Tribunal Superior Eleitoral uma auditoria no resultado do pleito no segundo turno, o que implicaria numa recontagem de votos. Inconformados com a derrota nas urnas, os tucanos querem conquistar a Presidência da República no tapetão, o que contradiz as suas pregações sobre democracia e ofende a mais alta corte da Justiça Eleitoral, na medida em que levanta suspeitas sobre a lisura do pleito. Com essa atitude irresponsável o PSDB acaba trabalhando também contra os seus próprios interesses, pois a mesma suspeita de fraude pode ser levantada sobre a eleição dos seus governadores. Na verdade observa-se uma mobilização de forças, liderada pelos tucanos e com a participação de elementos dos próprios partidos que formam a base aliada do governo, para, ignorando a vontade do povo, fazer valer os seus próprios interesses, atropelando a democracia que tanto invocam e tornando o país ingovernável. Acusados de apoiarem o golpe militar de 1964, os grandes veículos de comunicação de massa certamente não pretendem reviver a mesma aventura do passado e, por isso, não avalizam com amplas coberturas os movimentos articulados por setores descontentes com a reeleição da Presidenta. Isso explica o motivo pelo qual a grande mídia praticamente ignorou a ação dos tucanos junto ao TSE pela recontagem dos votos e, também, a manifestação realizada sábado em São Paulo por cerca de mil pessoas que, com faixas e cartazes, pediam não apenas a derrubada de Dilma mas, também, a volta dos militares ao poder. Oposicionistas no Congresso certamente vão aproveitar o fato para dizer que o povo brasileiro quer Dilma fora do Palácio do Planalto, como se o desejo de mil pessoas fosse maior do que o de mais de 50 milhões que a reelegeram. Desta vez, porém, parece que eles não encontrarão eco na imprensa que, obviamente, não deseja contribuir com essa maluquice de quem não viveu ou esqueceu o período da ditadura e pouco se importa com o futuro do país. Ao invés de ficar maquinando maneiras de arrancar, através de um golpe, a presidenta Dilma do Palácio do Planalto, para onde foi reconduzida legalmente pela maioria do povo brasileiro, o que os oposicionistas deveriam, em especial os tucanos, era voltar-se para dentro de si mesmos e tentar descobrir onde foi que erraram na corrida para a Presidência da República, de modo a fazer os ajustes de que precisam para uma nova tentativa em 2018. Se fizerem isso vão descobrir que um dos seus maiores erros foi tirar o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso do sarcófago e colocá-lo diante dos holofotes. Escondido antes por José Serra e Geraldo Alkmin, que sabiam da sua impopularidade, ele ficou eufórico com a gentileza de Aécio Neves e passou a deitar falação, causando enormes prejuízos à candidatura tucana. Foi ele quem disse, entre outras coisas, que os eleitores de Dilma eram os pobres e ignorantes nordestinos, o que certamente mexeu com os brios dos filhos do Nordeste, que deram a resposta nas urnas. Em artigo publicado no domingo, no entanto, ele atribui ao PT, na maior cara-de-pau, “a invenção de uma batalha dos pobres contra os ricos” e a insinuação de que “a oposição é contra os nordestinos”. Além disso, no mesmo artigo volta a negar as corrupções do seu governo e a reafirmar-se “pai do Plano Real”, mentiras que ninguém consegue mais engolir. O mais grave do seu texto, porém, foi recusar a mão estendida da presidenta Dilma Roussef para o diálogo, ao contrário da posição adotada inclusive pelo próprio Aécio que, a esta altura, deve estar arrependido de tê-lo desmumificado. O fato é que passada a eleição e proclamado o resultado oficial, os brasileiros de todos os matizes deveriam sair do clima de campanha eleitoral, em especial os líderes partidários, e, sem abandonar suas convicções políticas, contribuir para a pacificação do país. Em toda democracia a oposição é de fundamental importância para vigiar o governo, de modo a garantir que o seu trabalho se desenvolva dentro dos trilhos constitucionais, mas deve ser uma oposição construtiva, mais preocupada com os interesses maiores do país e do seu povo do que com a conquista do poder. A hora é de conciliação nacional. A Presidenta já deu o primeiro passo nesse sentido. Só os maus brasileiros, que não amam o seu país, querem estabelecer o caos, convencidos de que nesse ambiente conseguirão o que mais desejam: o poder.

sábado, 1 de novembro de 2014

Novos desafios

É surpreendente o cinismo de pessoas que falam em democracia e, ao mesmo tempo, se recusam a aceitar o veredito das urnas que reelegeu a presidenta Dilma Roussef. Alguns, inconformados com o resultado do pleito de domingo e babando de ódio, rejeitam qualquer proposta de diálogo e chegam a acenar com um impeachment, enquanto outros se revelam saudosos da ditadura, todos desejando ardentemente um golpe para mudar a decisão do povo que, por sua maioria, concedeu um segundo mandato a Dilma. Com o apoio da mídia, há ainda os que insistem em afirmar – certamente com o objetivo de criar um clima de hostilidade e de instabilidade – que o país ficou dividido porque uma parte dos eleitores votou na candidata petista e a outra parte no candidato tucano. É claro que essa história tola só convence quem tem um tijolo no lugar do cérebro, porque em toda eleição, em qualquer país do mundo onde haja democracia, os eleitores se dividem nos candidatos que a disputam. E o país obviamente não fica dividido. Não há registro, na história da Humanidade, de nenhum candidato que tenha recebido em seu país todos os votos do eleitorado. Ainda sem conseguir assimilar a derrota, os tucanos buscam justificativas para o resultado desfavorável das urnas, ora tentando negar a legitimidade da reeleição da Presidenta por conta da relativa pequena diferença de votos, ou acusando o que classificam de “pobres, ignorantes e burros” nordestinos como responsáveis pela sua vitória. Ocorre que Dilma foi votada não apenas no Nordeste, mas em todo o país, o que significa que, na visão dos tucanos, também são desprovidos de rendas, de conhecimentos e de inteligência os gaúchos, catarinenses, paranaenses, cariocas e mineiros que votaram nela. Pura tolice disseminada nas redes sociais, na verdade um insulto descabido aos eleitores, já que intelectuais, economistas e outras categorias profissionais lançaram manifestos em favor da Presidenta. Percebe-se, por outro lado, sem muita dificuldade, que o mecanismo que funcionou durante todo o período que antecedeu a eleição, para moer a Presidenta e derrotar o PT, voltou a movimentar-se logo após o resultado do pleito, agora buscando potencializar o ressentimento dos derrotados, inclusive dentro da própria base aliada do governo, de modo a criar o maior volume possível de obstáculos à governabilidade. A oposição, com sede de vingança por causa do resultado das urnas, fortaleceu-se com a adesão dos ressentidos do PMDB e impôs a primeira derrota ao Planalto após a eleição: derrubou na Câmara dos Deputados o decreto presidencial que ampliava a participação popular nos conselhos de gestão, confirmando o que a “Folha” havia antecipado em editorial. Entre os peemedebistas ressentidos está o deputado Henrique Eduardo Alves, que perdeu a eleição para o governo do Rio Grande do Norte e responsabiliza a Presidenta por sua derrota. Como presidente da Câmara – e movido pelo sentimento de vingança – ele pode criar enormes dificuldades para Dilma na condução dos projetos de interesse do governo. A derrubada do decreto sobre os conselhos está sendo interpretada como um aviso sobre o seu poder – e disposição – de infernizar a vida da Presidenta neste final de legislatura. E se o vice-presidente da República Michel Temer, presidente do PMDB, não impor sua autoridade dentro do partido a situação poderá ficar pior no próximo ano, pois o líder da sua bancada na Câmara, Eduardo Cunha, declarado oposicionista, já articula a sua eleição para a presidência da Casa. A presidenta Dilma, portanto, precisa articular-se urgentemente não apenas para neutralizar a ação da oposição e dos aliados rebeldes neste final de mandato da Câmara velha, já que muitos não conseguiram renová-los, mas sobretudo iniciar imediato processo de aproximação com os novos parlamentares, de modo a assegurar uma base mais confiável neste seu segundo mandato. Essa montagem de uma nova base no Legislativo se faz necessária e urgente para garantir a aprovação das reformas que ela prometeu realizar, especialmente a reforma política, considerando os sinais de dificuldades que já começaram a ser emitidos pelo Congresso, onde a proposta de plebiscito sempre foi rejeitada. E ela precisa do apoio popular para cumprir suas promessas de campanha. Dilma precisa de apoio também para a aprovação do marco regulatório da mídia, que deverá ter forte oposição não apenas da grande imprensa, que não pretende perder o seu poder de demolir governos e reputações e muito menos perder a sua impunidade, mas, também, de parlamentares que fazem parte do movimento antipetista e tem espaço assegurado nas páginas dos jornalões e na tela da TV. Entre estes está o líder do PSDB, deputado Antonio Imbassahy (ou será embaçai?), que já disse que “é preciso garantir a liberdade de imprensa” , repetindo o bordão dos que têm na grande mídia importante aliado para seus projetos políticos. Os que defendem a regulação, no entanto, como o cientista político Wanderley Guilherme dos Santos, querem o fim no monopólio das comunicações por grupos familiares. Para ele, a democratização dos meios de comunicação deve ser um dos temas mais urgentes para os próximos quatro anos do governo Dilma.